8 de setembro de 2013



Por que não espionam
e grampeiam a poesia?  
A estas horas a cidade dorme
e a grande potência
não envia o relatório
sobre a importância  da irradiação
do ozônio cordial da vizinhança
Aguardamos que o silêncio
não seja o espião na esquina
´mas só a aspa do canto do pássaro
‘a aspa da pipa em modelagens no ar
Por que não quebram
a criptografia  da zorra e da fome?
Por que não grampeiam os motores?
os decibéis? a máscara? o ruído?

6 de setembro de 2013

Um poema dedicado a mim no Facebook




Um poema dedicado a mim no Facebook, belo poema neobarroco, do potiguar Lívio Oliveira

 
Lugar-abismo

(Lívio Oliveira)

Cavalgo o meu corcel fantasma
penetro as capoeiras profundas
o jogo do tempo me alia ao sono
vislumbro antepassados tortos
e o sangue gela em chicotadas
cordões de umbigos amarrados
feridas se rompem em mais mágoas
as cabanas queimadas e o choro
de uma criança perdida ao sol
as nuvens correm lá no azul e venta
e ostenta o tempo um cálice vazio
o lábio seco a língua seca o olho
que fecha e vê por dentro o rombo
o sangue no embornal o ventre arrancado
fera ao redor aguarda e o bico afia
o corte prepara e lança com olho rútilo
não há senha da volta ao fogo outro
o frio domina e escurece alma e cala
tem que ser o que aqui se esgrime:
espinhos e adagas e furam e cortam.




Busco a palavra entre arquibancadas armadas para o desfile
A Pátria espera minha palavra e minha dança
Mãos atarraxam as últimas esquadrias na Esplanada
Esquadrias tantas vezes remontadas em outras festas
A minha palavra pede chaves e maçaricos
e mãos que a organize
estendam sobre seu dorso a ordem
o tapete enxuto para as próximas nádegas
A palavra para se encaixar num hino
Numa boca que a cante dentro de minha história
Busco a palavra ouvida no primeiro desfile
numa rua de saibro da infância
O garoto carrancudo chuta meus calcanhares descalços
aos insultos
Daí talvez este meu amor à Pátria com fúria
Enquanto viajo no eterno engarrafamento de volta para casa
buscando uma palavra para o improviso de amor à  Pátria
sem a mentira da metáfora
posso acrescentar mais uns versos:
Para apaziguar a minha fúria
o espectro de Clarice dorme à minha direita

1 de setembro de 2013

Poema dos netos



Enquanto comprava estantes de presente para os netos acondicionarem os livros e discos, fui construindo com eles este poema. Na madrugada, apresentei uma forma mais adiantada. E talvez o poema ainda sofra mais acréscimos ou ajustes:

Não desgasta os eixos de tuas pernas
com o sorver do deserto inútil
engastado numa tela
Reserva-as para os momentos
de ir onde ficam os freixos

e os sândalos das frondes vívidas
e recuperarás a ciência
de conhecer a voz das árvores
e do aninhar dos seixos
num caudal de fonte
A rua está vazia se te ausentas

A cidade se despedaça
se tu permites os vândalos

Repousa os nervos em sal
e as alturas não vençam
com o terror das dormências
Deixa sãs as tuas pernas
para a próxima montanha
Já o bulício das águas
Já canta um pássaro,
eriça as penas nas frondes
do vívido freixo
A aridez já se desfaz
quando os passos
saem por uma porta

RETRATO, poema de Antonio Machado

Traduzi para meu consumo o poema "Retrato", do espanhol Antonio Machado. Trata-se de um dos poetas de minha predileção, assim como...