Agradeço à equipe da Comunicação Social do Ministério da Fazenda, sobretudo ao Rafa, pela divulgação de uma entrevista comigo na página institucional do Gabinete do Ministro. Como a entrevista fica mais restrita aos funcionários do Gabinete, transfiro-a integralmente aqui para o blog.
Onde nasceu?
R: Nasci entre capoeiras na Fazenda Calvo, no município de Vianópolis, em Goiás. Mas me considero de Silvânia, pois a fazenda de meus avós se estendia pelos dois municípios, e nasci do outro lado do rio. Para afirmação de minha naturalidade, passaria a morar Silvânia, onde estudei no ginásio dos salesianos.
Quais suas paixões?
R: Como gosto da sagração de estar vivo, de participar das belezas que povoam cada margem de nosso caminho, são muitas as paixões de minha vida. Num dia pode ser as estrias amarelas de uma moita de bambu. Noutro, a rebeldia de uma pichação no tapume ao lado do meu caminho. As mulheres, os homens, as crianças, bem como a poesia e a música — são paixões obrigatórias. Estas não contam.
Algum ídolo?
R: Na minha geração, nasceram muitos ídolos, que agora se esfacelam. Lamento que a carência de ídolos transforme a geração atual em massas sem referenciais. Um ídolo? Antonio Conselheiro. Dois ídolos? Miles Davis e Beethoven. Três ídolos? Antonio Conselheiro, Miles Davis, Beethoven, Whitman. Uai, quatro? Eu seria muito mais pobre se não tivesse ouvido diversas vezes a Nona Sinfonia, e não seria rico sem os gumirins sobre as cevas dos rios de minha infância.
Algum hobby?
R: Conversar com um amigo e, se possível, ao som de jazz.
Qual estilo de musica que você mais gosta? Uma música para o dia de hoje.
R: Jazz, desde o dixeland ao minimalista. Mas, para ouvir hoje, “Bambino”, de José Miguel Wisnik, o sábio, com Elza Soares. Ou “Shout”, de Miles Davis.
Qual desejo de consumo?
R: Um livro de Hafiz, ainda a ser traduzido, com os seus 500 gazéis.
Quanto tempo de Fazenda?
R: Tempo suficiente para me aposentar. Mas, como os quadros do ministério estão renovados com a necessária juventude, muito me instiga a permanência. Vou ficando...
Fez algum curso de música? Desenho? Dança?
R: Nunca fiz nenhum curso específico de arte. Nem de música, desenho ou dança. Só de estética. Por isso, gosto de filosofia da arte, de história da música, de psicologia social. Lamentavelmente, danço abaixo do sofrível.
Esporte preferido.
R: Já pesquei, já nadei, já joguei cartas. Mas não pratico nenhum esporte com regularidade.
Uma viagem inesquecível. Por que?
R: Tenho muitos projetos de viagem, que acabam abortados na última hora. Para todo lugar que vou, acabo dentro de uma livraria. Mas sei que irei a Macchu Picchu e, lá em cima, lerei os poemas de Pablo Neruda sobre a localidade. Mas, qualquer travessia de vereda, para mim, é uma grande viagem. Não adianta viajarmos se não for para nos extasiarmos com a beleza e a história locais. Deixo a minha viagem a Carolina (MA), pois fui muito feliz diante de suas águas. Ou sentado diante do púlpito de Antonio Vieira, em Salvador, imaginando ouvir um de seus sermões.
Quando chega em casa, qual seus pensamentos, seus rituais?
R: Como raramente me alimento no meio da tarde, já entro em casa com fome. Não faço uma refeição completa — lancho, às vezes de pé. Assisto o jornal para repousar os pés, podendo deixar, muitas vezes, o banho para mais tarde. Leio, alimento meu blog, ouço música.
Tem plantas? Animais?
R: Tenho uma cadelinha dachshund. A Mel. E um limoeiro em homenagem ao poema Canção de Mignon, de Goethe, que serve de epígrafe para a Canção do exílio, de Gonçalves Dias :
Conheces o país onde florescem os limoeiros,
Em meio à folhagem escura ardem os pomos de ouro,
Uma brisa suave sopra no céu azul,
E o mirto e o louro em silêncio crescem?
Não o conheces?
Pois lá, para lá,
Quisera contigo, meu-bem amado, ir!
Conheces a casa, cujo teto repousa sobre colunas,
E onde brilham o salão e o aposento,
E marmóreas estátuas se erguem e me fitam:
Que te fizeram, minha pobre criança?
Não a conheces?
Pois lá, para lá,
Quisera contigo, meu protetor, ir!
Conheces a montanha e suas veredas enevoadas
Onde a mula, entre a neblinas, seu caminho procura
Nas cavernas habita a velha cria do Dragão
Onde a rocha se precipita, e sobre ela a torrente:
Não a conheces?
Pois lá, para lá,
Leva nossa caminho! Ó pai, sigamos pois tu e eu!
Sonhos?
R: Que não exista a eternidade! pois, se nos aborrecermos, estaremos impossibilitados de sair. A nossa cota de alegria e de infelicidade já é suficiente ao longo da existência terrena.
Conte uma história engraçada. Pode ser no trabalho, na vida pessoal. Qualquer uma.
R: Durante as crises econômicas das décadas 80/90, acontecia de alguma chefia não durar mais de um mês. Cada uma chegava alegando que “agora vai mudar”. Mandavam mudar as divisórias de lugar — até que se desgastaram os encaixes dos parafusos.
Além da história, eu gostaria de deixar um poema de minha autoria:
No galho a casca não é definitiva
Para filhotes surgem tocas,
as juntas amontoam pó e surgem trevos
Muda o pássaro a plumagem
só para ter outra coisa mais viva
e assim combinar com a nuvem
Vivo de me mudar de caminhos
para não ter de dar o mesmo tédio
Dar outro gosto à ternura
Vamos mudar de banda
Vamos mudar de brisa
E em meus braços nasçam ninhos
A poesia é meu território, e a cada dia planto e colho grãos em seus campos. Com a poesia, eu fundo e confundo a realidade. (Linoliogravura do fundo: Beto Nascimento)
23 de setembro de 2011
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