15 de junho de 2013

O grande Gatsby

Eu estava ansioso para assistir a nova versão cinematográfica de "O grande Gatsby", fenomenal romance de Scott Fitzgerald. Mas o filme não funciona. Mata a história. Eu gostaria de ver uma versão em que o Gatsby não aparecesse, como Fitzgerald defendeu até o fim. O filme peca pelo excesso de velocidade e pela mistureba de épocas culturais. Não dá para falar de 1920 com funk. E a velocidade que se dá às cenas, como se se tratasse de um louco e tresloucado jogo de videogame, torna-se impossível acompanhar cenário, qualidade dos figurinos e existência de personagens. Uma lástima.

Fábio de Sousa Coutinho

40 anos sem Neruda
 
                                                                               Pablo Neruda morreu em 23 de setembro de 1973, doze dias após o golpe imoral e sanguinário que esmagou a democracia no Chile e humilhou o povo chileno. Democrata desde sempre, não haveria de suportar a tutela fardada que se imporia aos destinos de seu país pelos dezessete anos que se seguiram à brutal quartelada fascista de 11 de setembro.
 
Já doente, a perpetração golpista acelerou-lhe a partida, por conta de intenso processo de somatização que adveio naqueles dias de lembrança tão triste. Abraçou, então, rapidamente, a "indesejada das gentes", na expressão de outro imenso bardo de nosso continente, Manuel Bandeira (que recebeu Neruda, em 30 de julho de 1945, numa sessão memorável da Academia Brasileira de Letras).
 
Nascido em 1904 e batizado Neftalí Ricardo Reyes Basoalto, adotou o pseudônimo literário de Pablo Neruda em 1920, aos 16 anos de idade, numa homenagem declarada ao poeta e contista tcheco Jan Neruda (1834-1891), por quem o chileno nutria enorme admiração. Sua vida de escritor e pacifista foi dividida, a par e passo, com uma carreira diplomática que o levou a representar o Chile nos mais diversos países, culminando com o importante cargo de Embaixador na França, seu último posto.
 
Intelectualmente consagrado logo a partir de seus primeiros livros de poesia (VINTE POEMAS DE AMOR E UMA CANÇÃO DESESPERADA, por exemplo, é de 1924), Neruda mereceu, no auge da maturidade, aos 67 anos, o Prêmio Nobel de Literatura, que a Academia Sueca lhe outorgou em 1971. Curiosamente, não foi o primeiro poeta de sua terra a receber o incomparável galardão: antes dele, Gabriela Mistral, em 1945, fora agraciada, por igual com inteira justiça.
 
Pablo Neruda foi um grande sedutor, um consumado fazedor de amizades imorredouras. No Brasil, foram seus amigos, além do já citado Manuel Bandeira, o casal Jorge Amado e Zélia Gattai, Vinícius de Moraes, Rubem Braga, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, Ferreira Gullar, Thiago de Mello e tantos outros escritores de elevada estirpe, todos prontos e dispostos ao convívio encantador do vate chileno, que nos visitou em várias ocasiões.
 
A partir de 1990, com a reinstauração do regime democrático no Chile, as casas de Neruda, em Santiago e em Valparaíso, saqueadas e vandalizadas em seguida ao golpe militar de 1973, foram recuperadas e abertas ao público, na condição de monumentos nacionais. Atualmente, hordas de turistas e visitantes de todo o mundo acorrem a essas residências, em gesto coletivo de engajada simpatia e de reverência cultural ao poeta da paz e à governança da poesia.
 
No marco dos quarenta anos da morte de Neruda, acabo de reler, com muita saudade, seu esplêndido livro de memórias, CONFESSO QUE VIVI, e, também, algumas de suas principais obras poéticas. De uma delas, O CORAÇÃO AMARELO, extraí o poema que ilustra e encerra este elogio de leitor apaixonado, na tradução de Olga Savary, uma das mais altas vozes femininas da lírica brasileira contemporânea:
 
                                                      FILOSOFIA 
 
                                              Fica provada a certeza
                                         da árvore verde na primavera
                                               e do córtex terrestre
                                        - alimentam-nos os planetas
                                                apesar das erupções
                                         e o mar nos oferece peixes
                                          apesar de seus maremotos-
                                              somos escravos da terra
                                            que também é dona do ar.
 
                                           Passeando por uma laranja
                                           eu passei mais de uma vida
                                           repetindo o globo terrestre
                                           - a geografia e a ambrosia-
                                             os jogos cor de jacinto
                                         e um cheiro branco de mulher
                                             como as flores da farinha.
 
                                             Nada se consegue voando
                                             para se escapar deste globo
                                              que te aprisiona ao nascer.
                                            E há que confessar esperando
                                             que o amor e o entendimento
                                               vêm de baixo, se levantam
                                                e crescem dentro de nós
                                                como cebolas, azinheiras,
                                                como tartarugas ou flores,
                                                como países, como raças,
                                                como caminhos e destinos.
                                      

RETRATO, poema de Antonio Machado

Traduzi para meu consumo o poema "Retrato", do espanhol Antonio Machado. Trata-se de um dos poetas de minha predileção, assim como...