5 de março de 2023

Pessoa uma Biografia

É a segunda biografia de Fernando Pessoa que leio. Não resta dúvida que em Pessoa uma Biografia Richard Zenith fez um trabalho com dedicação extremamente meticulosa, que respira até certa repetição de algumas informações.  Só não conseguiu afirmar o que o próprio Pessoa não deixou declaração explícita como o caso do homossexualismo. É um livro que segue o manual atual para elaborar uma biografia que se mostre atrativa. Contextualiza a época do biografado e dá um tom romanesco à narrativa. Em alguns momentos alguns episódios chegam a ser desnecessários e deslocados como são os casos dos dados biográficos de Kaváfis e Melville, escritores que não têm nenhuma ligação com a Pessoa, bem como a reestruturação urbana do Rio de Janeiro, que não teve nenhum influência sobre a obra do biografado. Como uma grande enciclopédia da época de Fernando Pessoa, esses e outros episódios trazem alguma utilidade, talvez até de conhecimento geral. Talvez Zenith devesse ter dado o título de Pessoa uma enciclopédia do seu tempo à sua obra  Temos de declarar que nem o esoterismo, nem as declarações a favor da escravidão ou a manifesta crença no sebastianismo, nada diminui a biografia ou a obra de Fernando Pessoa, que a cada dia se afirma como um dos maiores poetas da modernidade. Recomendo a leitura.

2 de março de 2023

Paúis

Este poema (Paúis, de Fernando Pessoa) é como se fosse o modelo do movimento denominado Paulismo, criado em Portugal por Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro. A obra completa de Fernando Pessoa pode ser acessada no Acervo do poeta. O poema critica a lama política que afetava Portugal por volta de 1910.

 

Pauis que roçarem ânsias pela minha alma em ouro...

Dobre longínquo d'Outros Sinos... Empalidece o louro

Trigo na cinza do poente... Corre um frio carnal por minha por minha alma...

Tão sempre a mesma, a Hora!... Balouçar de cimos de palma!...

Silêncio da parte inferior das folhas, outono delgado

D'um canto de vaga ave... Azul esquecidos em estagnado...

Ó que mudo grito de ânsia põe garras na Hora!...

Que pasmo de mim anseia por outra coisa que o que chora?...

Estendo as mãos para Além, mas no estender delas já vejo

Que não é aquilo que quero aquilo que desejo...

Címbalos de imperfeição... Ó tão antiguidade

A hora expulsa de si-Tempo!... Onda de recuo que invade

O meu abandonar-me a mim-próprio até desfalecer

E recordar tanto o eu presente que me sinto esquecer...

Fluido de auréola transparente de Foi, oco de ter-se...

O mistério sabe-me a eu ser outro... Luar sobre o não conter-se...

A sentinela é hirta, a lança que finca no chão

É mais alta que ela... P'ra que é tudo isto... Dia chão...

Trepadeiras de despropósito lambendo de Hora os aléns!

Horizontes fechando os olhos ao espaço em que são elos de erro!

Fanfarras de ópios de silêncios futuros!... Longes trens!...

Portões vistos longe, através das árvores, tão de ferro!...

1 de março de 2023

Victor Sosa

Faleceu em 6 de agosto de 2020 o poeta Victor Sousa. Mantivemos ótimas trocas de informações através dos recursos do e-mail. Um dos melhores poetas mundiais da geração de 80/90. Sem ele, a poesia cai um pouco na lona. Poeta que nasceu no Uruguai e se radicou no México em 1983. Meu contato com sua obra renovou minha maneira de compreender e de praticar a poesia. Se não consegui me aproximar com autenticidade do neobarroco, deve-se à falta da experiência do sincretismo no meu percurso de vida. No entanto, alguma vivacidade inventiva das vanguardas contaminou a minha produção (e de muitos outros poetas brasileiros), mas nenhum com a intensidade de um Victor Sosa ou Nestor Perlongher. A poesia de Victor Sosa não é simplesmente lírica, como qualifica o noticiário no momento de sua morte. Ela ultrapassa a lírica e ultrapassa a vanguarda latino-americana. Victor Sosa se vale da poesia oriental e da riqueza idiomática e mítica da cultura mexicana para entranhar em seus versos a experiência de existir com outra linguagem. A sua poesia não teria chegado a esse patamar se não fosse o contato com a pluralidade de línguas ameríndias do México, onde o espanhol se cunhou de forma renovada para formação do caráter da nação mexicana. Os poetas da chamada poesia de invenção, no Brasil, mantiveram íntima ligação com ele, resultando na publicação de toda a sua poesia no país. Foi o tradutor para o espanhol de diversos poetas brasileiros, dentre os quais João Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond de Andrade e Paulo Leminski. No momento de sua morte, estava trabalhando numa antologia de Haroldo de Campos para a editora Callygrama.

RETRATO, poema de Antonio Machado

Traduzi para meu consumo o poema "Retrato", do espanhol Antonio Machado. Trata-se de um dos poetas de minha predileção, assim como...