Quase acreditei nas montanhas
intocáveis por intempéries,
por algum gesto abrupto,
estúpido. Ou quedas.
Quase atingi a lascívia das sombras,
a naturalidade das ervas nas ranhuras
e eram pedras fabricadas em série.
Quase avistei o sol, quase
consumei o estupro, as cevas,
mas era falsa a embalagem.
Quase dormi de madrugada,
quase passei pela calçada.
Quase era palmeira na vereda.
Abandonei as pequenas estufas,
não me aventurei pelos pântanos.
Quase enfrentei o gesto de animar.
Quase meu nervo foi tocado
por toque voraz, inseto, torquês,
palavras, a ponta de taquara
a escapar de um cesto.
Não houve anúncios, ombros,
os gestos de enfurecer o sangue.
Quase tive a chuva na janela,
os ginetes reais, os javas,
os paramentos sobre os lumbagos.
Trafalgar, folguedos em Tordesilhas.
Todas as naus com especiarias, algas
no reluzir, cobres, pratas
de tremeluzir apagado em zinabre.
Quando pude, alcançou-me a lascívia
do chocho, do desânimo, da ferrugem.
Não era mais a estrada de Aquidauana,
de onde as colônias animavam
o luxo, a lascívia das nações. Brasões
de ouro não pus, não pus
bandeiras nos umbrais.
Pus mãos bordadas de escravidão
na fundura das braguilhas.
Agora o pus do desânimo das palavras.
A poesia é meu território, e a cada dia planto e colho grãos em seus campos. Com a poesia, eu fundo e confundo a realidade. (Linoliogravura do fundo: Beto Nascimento)
22 de janeiro de 2010
20 de janeiro de 2010
Os grãos ainda em sonolência
o granjeiro a tocá-los
com o estrume virgem das mãos
A distância das línguas férteis
em desconexas sílabas e engrenagens
Antes não fossem os reinos
ou as ostras a gerar riquezas
Antes não fossem as perdas
herdadas por algumas bocas
às quais os grãos se negam
e às quais se negam os sais
as sílabas os minerais de um calor
A permitida esgrima
com o esquecimento
Não aconteceria o chulo
a semente ressecada, a ova nula
Não aconteceria a penhora
os grãos triturados de uns seios
Antes não fosse o companheiro
numa viagem, numa visita
O companheiro sem estrume
sem ganas de dizer
sem ganas de ganhar um lírio
Antes não fosse o reino
das ostras incivis
a negar, a não permitir
o estoque da riqueza
São muitos os reinos
Os de Pascal, os dos grãos no estrume,
os de um país de muitas roupas íntimas
Ai! os reinos da lombalgia
Antes fossem os reinos
das ostras da civilidade
o granjeiro a tocá-los
com o estrume virgem das mãos
A distância das línguas férteis
em desconexas sílabas e engrenagens
Antes não fossem os reinos
ou as ostras a gerar riquezas
Antes não fossem as perdas
herdadas por algumas bocas
às quais os grãos se negam
e às quais se negam os sais
as sílabas os minerais de um calor
A permitida esgrima
com o esquecimento
Não aconteceria o chulo
a semente ressecada, a ova nula
Não aconteceria a penhora
os grãos triturados de uns seios
Antes não fosse o companheiro
numa viagem, numa visita
O companheiro sem estrume
sem ganas de dizer
sem ganas de ganhar um lírio
Antes não fosse o reino
das ostras incivis
a negar, a não permitir
o estoque da riqueza
São muitos os reinos
Os de Pascal, os dos grãos no estrume,
os de um país de muitas roupas íntimas
Ai! os reinos da lombalgia
Antes fossem os reinos
das ostras da civilidade
18 de janeiro de 2010
Blues por Scorsese

Por acaso, ao ir a um shopping, comprei numa pechicha de uma lonja de departamentos, o dvd "A história do Blues", documentáiro de Martin Scorsese. Fui averiguar e pude apurar que o dvd é relançamento, pois já esteve em catálogo em outras oportunidades.Trata-se de um concerto ao vivo na Radio City Music Hall, reunindo as lendas vivas do blues, com presença de novos. A abertura, com Anjelique Kidjo, é hilária. Ela canta uma música de raiz africana — eu que já gosto dela cantando music world. No dvd, o som está ótimo; a seleção dos músicos, incomperável; a imagem, digna de Scorsese, que já filmou documentário sobre Bob Dylan (também imperdível) e turnê dos Rolling Stones. Vou ficar revendo. E ouvindo. "Me enterre com uma pá de prata". "Eu odeio o sol de pondo..."
Leitura 2010
O texto abaixo foi produzido especialmente para o Jornal Opção, publicado em Goiânia. O texto, que saiu da edição desta semana, responde a enquete anual do jornal sobre o programa de elitura para 2010. Agradeço ao poeta Carlos Willian Leite a lembrança de meu nome para a enquete:
......
Escrevo daqui de Silvânia estas reflexões sobre os meus projetos de leitura em 2010, num momento em que as pequenas cidades vivem o apagão cultural, quando se devia esperar o contrário: crescimento das instalações para a prática da cultura, tais como cinemas, teatros, bibliotecas, com igual conscientização da população para a prática e uso destes bens; quando a juventude também poderia estar fazendo seus projetos de leituras e de comparecimento a outros tipo de espetáculos. No entanto.
No entanto, restam apenas as instalações para o alcoolismo e os pequenos montes de pedras nas vias públicas para os jovens e crianças, em seu abandono cultural, ficarem sentados à espera de nada. Podiam estar sentados pelo menos com algum livro na mão. Aqui mesmo em Silvânia, bem na praça pública — um bem público — está instalado o grande boteco público. Devíamos assistir no local à prática de folguedos, apresentações musicais, cinema volante, exercícios físicos. E a promotoria pública nem vê isso. Assistimos, portanto, em praça pública, a cultura bárbara da gritaria, do levantamento de copo e do incentivo à prostituição da juventude. Assim, vamos assistindo à aprendizagem da incivilidade. O caminho da civilidade se constrói com a boa ação pública cultural, que se dedica à construção de bens culturais. A incivilidade aceita a corrupção e a prostituição. Peço perdão pelo exemplo de Silvânia — cidade onde desenvolvi a aprendizagem da leitura e li grandes livros na biblioteca pública, mas é o exemplo que tenho em mãos no momento em que faço estas reflexões. Exemplos idênticos se repetem, em todas as pequenas municipalidades brasileiras. Portanto.
Portanto, as Secretarias de Estado de Cultura precisam criar uma cartilha para orientação das prefeituras na ação voltada para a instauração da cultura em suas comunidades. A prática da cultura é a ação mais barata da administração, pois depende mais da mobilização da população do que da construção de prédios públicos. Ainda recentemente, assistimos o noticiário sobre a melhoria do ensino no município de São Luíis do Norte (GO), conforme apurado pelo IDEB, através da realização de noites de pijama para os estudantes lerem poesia. Pelas declarações da secretária de Cultura, ninguém sabia inicialmente da importância do projeto. Acredito que a administração não teve de despender um centavo para esta programação. Quantas outras ações podem ser feitas de forma idêntica — sessões de cinema, nem que seja em televisão; grupos de teatro, de estudo! E deixamos para a juventude apenas a opção pelo estupro. Imaginemos.
Imaginemos os esforços para que a juventude crie agremiações de ação cultural, de clubes de leitura, de grupos de debate de cinema. Isso numa imaginação rasteira, pois a administração pode imaginar muito mais. Imaginemos: bibliotecas volantes. Só podemos pensar que há uma incivilidade na administração da cultura. Para que o desenvolvimento de projetos baratos se nos projetos baratos a porcentagem da corrupção é menor? A juventude no ócio, no desânimo, no desperdício da formação dos homens do futuro, enquanto isso.
Enquanto isso acontece, com previsibilidade de um País em dificuldade para construção de sua riqueza em razão de futuros homens doentes pelo alcolismo e pela ausência de cultura, tenho de desenvolver o meu projeto solitário de leitura para 2010, que certamente estará muito distante das possibilidades da imaginação e do desejo da juventude do meu Estado de Goiás, por que não, do meu País.
Eu poderia dizer que vou reler “O Pequeno Príncipe”, de Exupéry; “A Metamorfose”, de Kafka; “O Visconde Partido ao Meio”, de Italo Calvino; mas estes livros já reli várias vezes. Mas ficam aí como uma possibilidade de virem a integrar todas as bibliotecas dos pequenos municípios, assim como também possam integrar às bibliotecas os livros da série “Harry Potter” e “Crepúsculo”. Temos de oferecer à juventude aquilo que ela deseja ler. Até nós, escritores, lemos aquilo que escolhemos. Não lemos só por obrigação, mas sobretudo pelo chamamento do prazer e do instigamento da publicidade. A leitura que me dá prazer nem sempre será de entretenimento ou de interesse para a formação de outro. É lógico que há leituras obrigatórias para todos, independente da formação ou do interesse de cada um, tal como “Raízes do Brasil”, de Sérgio Buarque de Hollanda, pois temos de compreender a formação da brasilidade. Tanto acatamento de desmandos tem acontecido por incompreensão da própria brasilidade. Na política, temos de parar de perdoar o crime e a incivilidade da corrupção, e talvez até mesmo da tortura. Fica sempre a crença de que o corruptor será anistiado. Aguardamos ansiosos a aprovação, em 2010, do projeto que transforma a corrupção em crime hediondo. Mas, enfim.
Mas, enfim, sei que vou ler muita poesia goiana no início de 2010, pois estou organizando uma antologia da poesia de Goiás para a 2ª Bienal Internacional de Poesia da Biblioteca Nacional de Brasília. Comecei por Leo Lynce e Yêda Schmaltz. Comovente a leitura da poesia de Yêda Schmaltz, que tem uma das obras mais vastas na bibliografia da poesia goiana ao lado de Gabriel Nascente.
Na primeira semana de 2010, li “As Ilhas”, de Grenier, que acaba de sair pela editora Perspectiva. Escrevi uma mínima nota em meu blog manifestando rapidamente as minhas impressões sobre este livro. Sem ele, não existiria “O Estrangeiro”, de Camus. A obra de Camus vem daí e de “Moby Dick”, de Melvile, que é um livro maior dos maiores. “As Ilhas” é uma obra de pouca repercussão na história literária, mas é poético e demolidor.
Já estou lendo “2666” — romance póstumo do chileno Roberto Bolaño, em edição do Círculo de Lectores, da Espanha (www.circulo.es). A trama gira em torno de três ou quatro personagens que admiram um escritor fictício. É o primeiro livro que leio de Bolaño. Apesar de “Detetives Selvagens” ser considerado sua obra-prima, preferi começar pela romance póstumo. Gosto da incompletude nas obras literárias, pois sempre me atiçam a curiosidade de imaginar como seria a obra concluída dentro do desejo e do trabalho do autor, por isso minha paixão por “Almas Mortas”, de Gogol, e “O Homem Sem Qualidades”, de Musil. Mas sinto que vou gostar de Bolaño.
Sempre gostei da ficção volumosa, dos grandes painéis: “O Tempo e o Vento”, de Erico Verissimo; “O Dom Silencioso”, de Sholokhov; “Guerra e Paz”, do Tolstói. Por isso, em 2010, imagino que vou ler algum romance caudaloso. Não sei se lerei em 2010 a trilogia “José”, de Thomas Mann; ou “Os Miseráveis”, de Victor Hugo; mas certamente lerei “O Sonho do Pavilhão Dourado”, do chinês Xao (ou Cao) Xueqin, na edição que já encomendei também ao Círculo de Lectores. Ainda não temos edição disponível em português desta obra, que era da predileção de Borges. Trata-se da maior novela chinesa, escrita nos meados do século 17, e retrata a decadência feudal daquele País. Foi escrita em 120 capítulos, que estão distribuídos em mais de 2 mil páginas. Dá impressão de ser uma obra inconclusa, pois há informações que Xao Xueqin teria escrito entre 80 e 110 capítulos e outro autor teria escrito o restante. Até sobre “O Dom Silencioso” paira dúvidas sobre a autoria, pois Sholokhov teria roubado os originais de um soldado branco durante a Revolução Russa. E assim vai se construindo o mito em torno das grandes obras.
Como tenho lido todos os livros de Yasunari Kawabata, lerei com certeza em 2010 o romance “O Som da Montanha”, que acaba de sair pela Estação Liberdade, que vem editando no Brasil as obras deste Nobel japonês. Trata-se do romance que conclui a “trilogia dos sentimentos”. As grandes obras sempre trazem viés críticas embutidas nelas — pois nenhuma se realiza pelo que é puramente linguagem. Assim como “O Sonho do Pavilhão Dourado” reflete sobre a decadência feudal da China, este Kawabata, além do tema recorrente do suicídio na literatura japonesa, trata da decadência moral do Japão do pós-guerra.
Assim, posso deduzir que me deterei, em minhas leituras de 2010, no oportuno tema da decadência. Resta a esperança de que, nos próximos anos, venhamos a ter a oportunidade de ler uma obra brasileira — seja romanesca ou de interpretação histórica — criticando a decadência de nossa atual sociedade, que está enfrentando crescimento econômico, mas despreparada para conviver com a cultura e com a responsabilidade administrativa.
......
Escrevo daqui de Silvânia estas reflexões sobre os meus projetos de leitura em 2010, num momento em que as pequenas cidades vivem o apagão cultural, quando se devia esperar o contrário: crescimento das instalações para a prática da cultura, tais como cinemas, teatros, bibliotecas, com igual conscientização da população para a prática e uso destes bens; quando a juventude também poderia estar fazendo seus projetos de leituras e de comparecimento a outros tipo de espetáculos. No entanto.
No entanto, restam apenas as instalações para o alcoolismo e os pequenos montes de pedras nas vias públicas para os jovens e crianças, em seu abandono cultural, ficarem sentados à espera de nada. Podiam estar sentados pelo menos com algum livro na mão. Aqui mesmo em Silvânia, bem na praça pública — um bem público — está instalado o grande boteco público. Devíamos assistir no local à prática de folguedos, apresentações musicais, cinema volante, exercícios físicos. E a promotoria pública nem vê isso. Assistimos, portanto, em praça pública, a cultura bárbara da gritaria, do levantamento de copo e do incentivo à prostituição da juventude. Assim, vamos assistindo à aprendizagem da incivilidade. O caminho da civilidade se constrói com a boa ação pública cultural, que se dedica à construção de bens culturais. A incivilidade aceita a corrupção e a prostituição. Peço perdão pelo exemplo de Silvânia — cidade onde desenvolvi a aprendizagem da leitura e li grandes livros na biblioteca pública, mas é o exemplo que tenho em mãos no momento em que faço estas reflexões. Exemplos idênticos se repetem, em todas as pequenas municipalidades brasileiras. Portanto.
Portanto, as Secretarias de Estado de Cultura precisam criar uma cartilha para orientação das prefeituras na ação voltada para a instauração da cultura em suas comunidades. A prática da cultura é a ação mais barata da administração, pois depende mais da mobilização da população do que da construção de prédios públicos. Ainda recentemente, assistimos o noticiário sobre a melhoria do ensino no município de São Luíis do Norte (GO), conforme apurado pelo IDEB, através da realização de noites de pijama para os estudantes lerem poesia. Pelas declarações da secretária de Cultura, ninguém sabia inicialmente da importância do projeto. Acredito que a administração não teve de despender um centavo para esta programação. Quantas outras ações podem ser feitas de forma idêntica — sessões de cinema, nem que seja em televisão; grupos de teatro, de estudo! E deixamos para a juventude apenas a opção pelo estupro. Imaginemos.
Imaginemos os esforços para que a juventude crie agremiações de ação cultural, de clubes de leitura, de grupos de debate de cinema. Isso numa imaginação rasteira, pois a administração pode imaginar muito mais. Imaginemos: bibliotecas volantes. Só podemos pensar que há uma incivilidade na administração da cultura. Para que o desenvolvimento de projetos baratos se nos projetos baratos a porcentagem da corrupção é menor? A juventude no ócio, no desânimo, no desperdício da formação dos homens do futuro, enquanto isso.
Enquanto isso acontece, com previsibilidade de um País em dificuldade para construção de sua riqueza em razão de futuros homens doentes pelo alcolismo e pela ausência de cultura, tenho de desenvolver o meu projeto solitário de leitura para 2010, que certamente estará muito distante das possibilidades da imaginação e do desejo da juventude do meu Estado de Goiás, por que não, do meu País.
Eu poderia dizer que vou reler “O Pequeno Príncipe”, de Exupéry; “A Metamorfose”, de Kafka; “O Visconde Partido ao Meio”, de Italo Calvino; mas estes livros já reli várias vezes. Mas ficam aí como uma possibilidade de virem a integrar todas as bibliotecas dos pequenos municípios, assim como também possam integrar às bibliotecas os livros da série “Harry Potter” e “Crepúsculo”. Temos de oferecer à juventude aquilo que ela deseja ler. Até nós, escritores, lemos aquilo que escolhemos. Não lemos só por obrigação, mas sobretudo pelo chamamento do prazer e do instigamento da publicidade. A leitura que me dá prazer nem sempre será de entretenimento ou de interesse para a formação de outro. É lógico que há leituras obrigatórias para todos, independente da formação ou do interesse de cada um, tal como “Raízes do Brasil”, de Sérgio Buarque de Hollanda, pois temos de compreender a formação da brasilidade. Tanto acatamento de desmandos tem acontecido por incompreensão da própria brasilidade. Na política, temos de parar de perdoar o crime e a incivilidade da corrupção, e talvez até mesmo da tortura. Fica sempre a crença de que o corruptor será anistiado. Aguardamos ansiosos a aprovação, em 2010, do projeto que transforma a corrupção em crime hediondo. Mas, enfim.
Mas, enfim, sei que vou ler muita poesia goiana no início de 2010, pois estou organizando uma antologia da poesia de Goiás para a 2ª Bienal Internacional de Poesia da Biblioteca Nacional de Brasília. Comecei por Leo Lynce e Yêda Schmaltz. Comovente a leitura da poesia de Yêda Schmaltz, que tem uma das obras mais vastas na bibliografia da poesia goiana ao lado de Gabriel Nascente.
Na primeira semana de 2010, li “As Ilhas”, de Grenier, que acaba de sair pela editora Perspectiva. Escrevi uma mínima nota em meu blog manifestando rapidamente as minhas impressões sobre este livro. Sem ele, não existiria “O Estrangeiro”, de Camus. A obra de Camus vem daí e de “Moby Dick”, de Melvile, que é um livro maior dos maiores. “As Ilhas” é uma obra de pouca repercussão na história literária, mas é poético e demolidor.
Já estou lendo “2666” — romance póstumo do chileno Roberto Bolaño, em edição do Círculo de Lectores, da Espanha (www.circulo.es). A trama gira em torno de três ou quatro personagens que admiram um escritor fictício. É o primeiro livro que leio de Bolaño. Apesar de “Detetives Selvagens” ser considerado sua obra-prima, preferi começar pela romance póstumo. Gosto da incompletude nas obras literárias, pois sempre me atiçam a curiosidade de imaginar como seria a obra concluída dentro do desejo e do trabalho do autor, por isso minha paixão por “Almas Mortas”, de Gogol, e “O Homem Sem Qualidades”, de Musil. Mas sinto que vou gostar de Bolaño.
Sempre gostei da ficção volumosa, dos grandes painéis: “O Tempo e o Vento”, de Erico Verissimo; “O Dom Silencioso”, de Sholokhov; “Guerra e Paz”, do Tolstói. Por isso, em 2010, imagino que vou ler algum romance caudaloso. Não sei se lerei em 2010 a trilogia “José”, de Thomas Mann; ou “Os Miseráveis”, de Victor Hugo; mas certamente lerei “O Sonho do Pavilhão Dourado”, do chinês Xao (ou Cao) Xueqin, na edição que já encomendei também ao Círculo de Lectores. Ainda não temos edição disponível em português desta obra, que era da predileção de Borges. Trata-se da maior novela chinesa, escrita nos meados do século 17, e retrata a decadência feudal daquele País. Foi escrita em 120 capítulos, que estão distribuídos em mais de 2 mil páginas. Dá impressão de ser uma obra inconclusa, pois há informações que Xao Xueqin teria escrito entre 80 e 110 capítulos e outro autor teria escrito o restante. Até sobre “O Dom Silencioso” paira dúvidas sobre a autoria, pois Sholokhov teria roubado os originais de um soldado branco durante a Revolução Russa. E assim vai se construindo o mito em torno das grandes obras.
Como tenho lido todos os livros de Yasunari Kawabata, lerei com certeza em 2010 o romance “O Som da Montanha”, que acaba de sair pela Estação Liberdade, que vem editando no Brasil as obras deste Nobel japonês. Trata-se do romance que conclui a “trilogia dos sentimentos”. As grandes obras sempre trazem viés críticas embutidas nelas — pois nenhuma se realiza pelo que é puramente linguagem. Assim como “O Sonho do Pavilhão Dourado” reflete sobre a decadência feudal da China, este Kawabata, além do tema recorrente do suicídio na literatura japonesa, trata da decadência moral do Japão do pós-guerra.
Assim, posso deduzir que me deterei, em minhas leituras de 2010, no oportuno tema da decadência. Resta a esperança de que, nos próximos anos, venhamos a ter a oportunidade de ler uma obra brasileira — seja romanesca ou de interpretação histórica — criticando a decadência de nossa atual sociedade, que está enfrentando crescimento econômico, mas despreparada para conviver com a cultura e com a responsabilidade administrativa.
5 de janeiro de 2010
Grenier
Já justifiquei as minhas férias com a leitura de "As ilhas", de Jean Grenier — lançamento da Perspectiva. Sem este livro, admirado por Albert Camus, não existiria "O estrangeiro". Não sei o que é mais demolidor — Schopenhauer ou Grenier. OU o tal do "Tao".
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