Na quinta-feira, 21.6.12, recebi mais um livro em que estão envolvidos três amigos. "A arquitetura verbal de Nilto Maciel", fortuna crítica organizada pelo poeta João Carlos Taveira, e que traz duas resenhas de minha autoria. O livro já está programado para ser lançado em Brasília, em 9.8.12, a partir de 18h30, no Carpe Diem. Em Fortaleza, o lançamento deverá ocorrer em setembro. São 326 páginas, ilustradas pelas capas dos livros já editados por Nilto Maciel, que agrupam análises críticas atestando a importância de uma obra já inscrita na história da literatura brasileira. Basta ver que os mais importantes livros sobre a ficção brasileira da atualidade remetem à obra de Nilto Maciel. Na apresentação, João Carlos Taveira afirma: "Hoje, sem medo de errar, posso afirmar que muito raramente tenho encontrado em minha trajetória um talendo à altura de Nilto Maciel, esse nobre filho de Baturité, do Ceará e do Brasil de tantos gênios, não só na literatura, como na música, nas artes plásticas, nas artes cênicas."
Os meus encontros com Nilto Maciel, quando morávamos em Taguatinga, e mesmo quando ele se transferiu para o Plano Piloto, desde os idos da década de 1980, eu deixo para narrar nalguma futura resenha memorialística, onde poderei confidenciar as nossas estripulias e as de nossos filhos.
A poesia é meu território, e a cada dia planto e colho grãos em seus campos. Com a poesia, eu fundo e confundo a realidade. (Linoliogravura do fundo: Beto Nascimento)
30 de junho de 2012
Giorgio Caproni
Algumas publicações não podem passar desapercebidas. E uma delas é o livro da UFSC "A coisa perdida", que traz a poesia do italiano Giorgio Caproni e o estudo de Agmbem sobre o poeta. É uma poesia enxuta, necessária. Reserve logo o seu exemplar.
Dois poemas:
Lembrança
Lembro uma igreja antiga,
ermida,
na hora em que o ar se alaranja
e cada voz se greta
sob a arcada do céu.
Estavas fatigada,
e sentamo-nos num degrau:
nós dois mendigos.
No entanto o sangue fervia
de maravilha, ao ver
cada ave mudar-se em estrela
no céu.
Tudo
Queimaram tudo.
A igreja. A escola.
O município.
Tudo.
Até a relva.
Até,
com o campo-santo, a fumaça
tênue da chaminé
da fornalha.
Ilesa,
alvorece apenas a areia
e a água: a água que treme
à minha voz, e espelha
a esqualidez de um grito
sem nascedouro.
A gente
não sabe mais onde fica.
Queimada também a tasca.
Também o ônibus.
Tudo.
Não resta sequer o luto,
no cinza, a esperar a parva
(inexistete) palavra.
Dois poemas:
Lembrança
Lembro uma igreja antiga,
ermida,
na hora em que o ar se alaranja
e cada voz se greta
sob a arcada do céu.
Estavas fatigada,
e sentamo-nos num degrau:
nós dois mendigos.
No entanto o sangue fervia
de maravilha, ao ver
cada ave mudar-se em estrela
no céu.
Tudo
Queimaram tudo.
A igreja. A escola.
O município.
Tudo.
Até a relva.
Até,
com o campo-santo, a fumaça
tênue da chaminé
da fornalha.
Ilesa,
alvorece apenas a areia
e a água: a água que treme
à minha voz, e espelha
a esqualidez de um grito
sem nascedouro.
A gente
não sabe mais onde fica.
Queimada também a tasca.
Também o ônibus.
Tudo.
Não resta sequer o luto,
no cinza, a esperar a parva
(inexistete) palavra.
Ronaldo Costa Fernandes
O ponto eletrônico do cotidiano está impedindo que eu e Ronaldo Costa Fernandes retomemos os nossos cafés em alguma livraria da cidade nalguma quinta-feira à tarde. No dia 25 de maio, ele lançou mais um livro de poesia. "Memória dos porcos" - título nervoso, no entanto, retrata o momento raivoso que o poeta bem que sabe mas não sabe em que atirar, em quê. O real e a linguagem estão em guerra com a Poesia. O poeta se confunde neste universo em mutação - vitrual e real, sem definir em que local cada um se fixará.Aí num mesmo ambiente o cemitério e a cantiga de ninar. Um poema do livro:
Minha foz não é de Iguaçu
A rotina muralha e dique das vontades.
Tudo comporta minha voracidade represada.
As hélices da liberdade
logo percebo são asas de borboleta,
lúbricas, mas aleatórias e divergentes.
O que me põe elétrico são as turbinas do sonho.
Em outros momentos, seco-me.
Desaba sobre mim o desânimo.
Não sinto nenhuma energia.
Só uma queda na seca.
Um arame de água
- o desconforto do abismo -
nada de mar vertical,
o drama de esperar
a catarata do tédio
as sete quedas da semana.
Minha foz não é de Iguaçu
A rotina muralha e dique das vontades.
Tudo comporta minha voracidade represada.
As hélices da liberdade
logo percebo são asas de borboleta,
lúbricas, mas aleatórias e divergentes.
O que me põe elétrico são as turbinas do sonho.
Em outros momentos, seco-me.
Desaba sobre mim o desânimo.
Não sinto nenhuma energia.
Só uma queda na seca.
Um arame de água
- o desconforto do abismo -
nada de mar vertical,
o drama de esperar
a catarata do tédio
as sete quedas da semana.
W.J.Solha
Enquanto decido o que fazer deste sábado de sol e solidão, vou pagando umas dívidas literárias.
Na década de 80 (oh! quanto tempo!), nos encontros da livraria Literatura, extinta livraria Literatura, eu e Nilto Maciel, Emanuel Medeiros e José Sales e outros, e em outros locais de Brasília, sempre mencionávamos a existência ímpar do cearense W. J. Solha na literatura brasileira! Trata-se de uma literatura experimental, corajosa! Em março (mais um registro com excessivo atraso), ele me encaminhou o livro "Marco do mundo", um longo poema que se esgarça com a história do mundo e das viagens interiores do poeta. Ousadia pura! Foi editado também por uma pequena editora (Ideia). Antes de publicá-lo, Solha submeteu o original a vários escritores. Hildebrando Barbosa Filho, na primeira capa, diz: "Uma estranha, surpreendente e delirante bricolagem. A construção de Marco/Mundo me parece a própria elaboração do Marco/Poema." Acredito que a poesia começa onde há estes testes de experimentações. Solha, só olho contigo.
Um trecho:
Tudo é uma roda
grande
rodando na roda
pequena.
Você já viu esta cena:
o céu numa poça rasa
milênios antes da Nasa.
Na década de 80 (oh! quanto tempo!), nos encontros da livraria Literatura, extinta livraria Literatura, eu e Nilto Maciel, Emanuel Medeiros e José Sales e outros, e em outros locais de Brasília, sempre mencionávamos a existência ímpar do cearense W. J. Solha na literatura brasileira! Trata-se de uma literatura experimental, corajosa! Em março (mais um registro com excessivo atraso), ele me encaminhou o livro "Marco do mundo", um longo poema que se esgarça com a história do mundo e das viagens interiores do poeta. Ousadia pura! Foi editado também por uma pequena editora (Ideia). Antes de publicá-lo, Solha submeteu o original a vários escritores. Hildebrando Barbosa Filho, na primeira capa, diz: "Uma estranha, surpreendente e delirante bricolagem. A construção de Marco/Mundo me parece a própria elaboração do Marco/Poema." Acredito que a poesia começa onde há estes testes de experimentações. Solha, só olho contigo.
Um trecho:
Tudo é uma roda
grande
rodando na roda
pequena.
Você já viu esta cena:
o céu numa poça rasa
milênios antes da Nasa.
Astrid Cabral
Com atraso, com excessivo atraso, registro dois livros que a amiga e poeta importantíssima do Brasil, Astrid Cabral, encaminhou-me em dezembro. A reedição de "Intramuros", que foi o Prêmio Helena Kolody, de 1997. E "Palavra na berlinda", de 2011, pela editora Ibis Libris. Temos de saudar as pequenas editoras, pois elas salvam a poesia do anonimato. Geralmente são criadas já para expressão da paixão de seus propretários pela poesia. O "Intramuros" é da Valter Editora. O livros do Alcides Buss, registrado abaixo, é da Caminho de Dentro. Portanto, só editoras que estão fora do grande circuito. "Intramuros" traz poemas sore o cotidiano da mulher, assim como os poemas de Cora Coralina - Astrid Cabral que circulou muito por Goiás, pois esposa do poeta goiano Affonso Félix de Souza. Estou vendo que ela fez um poema para uma pedra que lhe foi presenteada por José Godoy Garcia, outro grande poeta de Goiás. Eu também tenho a minha pedra presenteada por José Godoy Garcia. Parece um sapo em minha estante.
Um poema de "Intramuros". Vejam que sutileza a transformação do instestino numa louça e em outro astro, com a sonoridade no aço do dente. Só a poesia para salvar o imaginário! Astrid, sou apaixonado pela sua poesia!
Metamorfose
No regaço da louça
o pêssego corado
é um pequeno sol.
Como à tentação resistirem
os dentes famintos?
Logo o astro se eclipsa
pelo túnel do corpo
e se torna bagaço
no regaço de outra louça.
Um poema de "Intramuros". Vejam que sutileza a transformação do instestino numa louça e em outro astro, com a sonoridade no aço do dente. Só a poesia para salvar o imaginário! Astrid, sou apaixonado pela sua poesia!
Metamorfose
No regaço da louça
o pêssego corado
é um pequeno sol.
Como à tentação resistirem
os dentes famintos?
Logo o astro se eclipsa
pelo túnel do corpo
e se torna bagaço
no regaço de outra louça.
Alcides Buss
Amigo de longa data, o poeta Alcides Buss, de Santa Catarina, encaminhou-me seu recente "Janela para o mar", que já pode ser encomendado nas melhores livrarias. Trata de um tema eterno, que passou pelos gregos, Camões, Pessoa, Cecília Meirelles: o mar. Ele, Alcides, que vive no meio do mar: Florianópolis. Arranca ternuras, cores, vôos de todas espécies sobre o mar. Sei que Alcides Buss é um poeta que já está inserido ma história da poesia brasileira". Um poema do livro:]
MARESIA
Nada tenho,
a não ser o vazio
de nada ter.
Nada sou,
a não ser esta lacuna
do tamanho da vida.
Pergunto
por mim
- responde-me
o silêncio
que jamais termina.
MARESIA
Nada tenho,
a não ser o vazio
de nada ter.
Nada sou,
a não ser esta lacuna
do tamanho da vida.
Pergunto
por mim
- responde-me
o silêncio
que jamais termina.
17 de junho de 2012
Todo preâmbulo inaugura o medo.
São as luas, os rochedos ou
os abismos voluntários.
Permanecem pelos séculos
a dominar o infinito ou
a encher de orgias
a permanência e a cárie.
Outros são os componentes
dos fuzis, dos afogamentos
no Tibre, dos saques aos caixas ou
da espessura da lingerie.
Das intrépidas e inúteis
folhas de guarda.
Primaveras unitárias
tragadas pelas boquilhas
seguem com os transeuntes,
raspam pelos lábios,
expelem erupções pelas nádegas.
Ninguém entende o furúnculo,
a harmonia das águas e das pétalas.
E se houvesse entendimento ou
a extinção da linha do tempo,
quem iria recolher o sal,
construir a alvura ou
estrear o lençol e a luz?
Quem iria preparar
o combate aos vândalos?
O que há é o medo
e a porta de ouro que não o extingue.
15 de junho de 2012
Poema da insanidade
o homem definitivo
não insana com ausência,
com justiça cerrada,
encontros ao acaso.
qual o encontro
não se desenlaça
se o ata o furor,
o cheque que compra
o parceiro na praça?
o homem definitivo
não traz coágulos
do desabraço,
da cementeira
aos despedaços
não insana com ausência,
com justiça cerrada,
encontros ao acaso.
qual o encontro
não se desenlaça
se o ata o furor,
o cheque que compra
o parceiro na praça?
o homem definitivo
não traz coágulos
do desabraço,
da cementeira
aos despedaços
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